Há algum tempo atrás, o novo e abençoadíssimo Papa Bento XVI, disse, não sei se em rede internacional, ou em alguma de suas inúmeras entrevistas, que a humanidade, e principalmente a juventude, adoecia de uma profunda "falta de perspectiva".
Que perspectiva é essa? E que falta é essa que, nas palavras do próprio Papa, parece constituir espécie de doença degenerativa, que aparenta assolar e corroer o espírito do homem contemporâneo?
Escrevi um texto honestamente influenciado, em matéria de escrita, pelo discurso poético do Nietzsche. Não sei se a tradução é perfeita ou não, mas desde o Zaratustra, que li há mais de dois anos, fui contaminado pela sua expressão inimitável, a qual, sem querer, tento imitar.
A matéria do discurso pode condizer ou não com a opinião de vocês, e isso, de fato, pouco me importa. Leiam e ponderem. Será que tagarelo como um louco, ou me faço o mais lúcido dos homens?
O texto teve, em base, algumas idéias estritamente nietzscheanas que se incorporaram ao meu pensamento.
"Hoje acordei bem cedo, porque quero contemplar bem o dia. Ele amanhece pelas seis e meia, e o sol é tão lindo, tão radiante! Sua cabeça dourada ri entre as nuvens, molestado pelo otimismo dos homens.
"Hoje acordo cedo, para sentir muito bem a brisa da manhã, fresca, esgotando nas folhas todo o orvalho da umidade. Nelas, respirarei os perfumes da natureza, e me agarrarei à vida ferrenho e balofo.
"Agradeço a Deus por cada dia que Ele me dá; em cada dia, ponho o meu espírito a contemplá-lo, e a saciar-me do Mundo, como se o esgotasse em um oásis, sedento de sede.
"O sorriso nos homens eu procuro, sempre com um sorriso largo e bem demonstrado. Quero que em meus dentes rebrilhe a dureza do sol, e o seu cântico, que é um hino à vida!
"Ando bem de mansinho, e curvo-me diante das asperezas. É preciso suportar a dor, e todo o tipo de adversidade com a humildade dos novilhos, se quer viver até velhinho. Ainda amarei cabelos prateados que crescem e emolduram o meu rosto, porque lá o sol ainda brilhara jocoso, e o meu riso escalará o vértice celeste.
"Curvo-me, bem o sei. Quereria não me curvar, não entregar-me assim, com essa ponta de ressentimento vão; ah, ressentimento. É um veneno sutil, uma dorzinha de cabeça que sempre sobrevém-me no sorriso, reforçando-o mais um pouco quando dele me imagino vitorioso.
"Agora pensando bem, secretamente, quando a noite puxa o seu véu estrelado e bonito (ah! Como o amo!), invade-me o desejo de fantasiar o triunfo, a glória, a valentia que os antigos helenos faziam troar nos ares belicosos! Ah! Se eu tivesse uma espada! Se fosse tão indiferente e 'assassino da vida'!
"Indiferença! Bah! Quem precisa dela? A vida é apenas uma. É uma dádiva que, humildemente, recebemos e apreciamos até o fim dos dias. Apreciamos, deleitamo-nos dela. Ela é tão linda! Tão radiante! A Morte... esta traz o esquecimento do Nada! O horrível abraço gélido do abismo. Nada podemos esperar da Morte que não absolutamente nada. A vida esvaziada de si. O horror da inconsciência. A vida, que vivo alegremente, no fundo é um constante direcionar de forças para o abismo.
"Queria ter asas! Asas de águia. Mergulharia nele, e voltaria do abismo, conhecendo-lhe as concavidades, o desenho que o tempo perpetua nas rochas. Ali, conheceria os segredos do penhasco, e poderia realizar o definitivo vôo da Fênix, tantas vezes...
"Mas não! Não podendo voltar dos mortos, e tendo Deus sido tão generoso com esta vida mortal, esta... esta... vida efêmera, passageira, mais leve que o rarefeito éter, mais leve que uma folha cadente no Outono,... devo consumir cada segundo, agarrado covardemente a ele, cada pequeno grão da areia do tempo, cada pequena fagulha da eternidade que, subitamente, ilumina a fauce do abismo, e se cala no infinito. Ah, sim! Viver... viver cada segundo, como se a morte de cada pequena centelha no vento da Eternidade, fosse um suplício, um erro! Erro! Suplício!
"Suplico pela maçã que foi mordida! Pelo pecado maior que carrego no ombro, fardo do meu sangue de Adão.
"Cada segundo, agarrado com a voracidade de verdadeiro lobo, é um triunfo que tenho sobre a vontade divina e inflexível?
"Cada revolução solar é um novo começo, o qual engulo, o qual devoro, com minhas presas famintas. Quero o sangue da Terra e do Céu vertendo entre meus dentes!
"Esvaziar os frutos da Árvore da Vida. Que seja o preço meu orgulho, minha dignidade, que importa! A vida é bela! As músicas nos comovem. Somos eternos bichinhos comovidos pelo instante.
"A fugacidade do instante inebria-me. Estou bêbado, dançando sobre minha sepultura como um macaco, e, no entanto, sem saber, entoando o verdadeiro hino da Morte!
"Mergulhar em cada momento, esquecendo-me de ser Homem. Sou bicho, extasiado numa canção que não é minha. Amedrontado pela aniquilação voluptuosa dos prazeres. O Futuro é uma sombra distante frente à claridade do meu sonambulismo!"
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3 comentários:
Não sei se essa beleza é sua ou de Nietzsche, nem me importa. Sua escrita glorifica a vida e a palavra, por isso, é bonita, concreta e viva. Leio as frases e sinto Lestat de Lioncourt encarnado nelas. Que sopro de delicadeza e intensidade nos vislumbram entre fonemas, sílabas, signos e frases e texto. Pode-se ser capturado na teia. Eu fui.
Meu, o papa te deu uma inspiração e tanto hein? AHAUHUAHA Curti. Não vou fazer nenhum paralelo entre a sua escrita e a de Nietzsche pq eu nunca tive paciencia de ler nada dele :B Mas eu acho tanto bonito quanto estranho esse seu jeito de escrever, parece que vc quer se equiparar a autores clássicos e toma exemplos e posicionamentos que eles teriam, porque no contexto deles, foi assim. Digo isso pq eu sinto uma grande naturalidade nos seus textos qnd vc vem a comparar o tempo como areia (ampulheta) e outras coisas, porque são elementos de uma dada época passada.. Eu não consigo fazer isso que vc faz por estar mto agarrada às características desse tempo..
Mas enfim, resumindo XD eu achei o texto muito bonito, maduro e de total revogação desse discurso do Papa, mas eu me sinto um pouco alfinetada por esse seu apego tão grande nesses estilos. Acho mto bem que vc pode fazer algo mais 'recente', isso é fácil, mas queria ler algo de um estilo só seu :3
Ficou lindo o texto! Parabéns!
AMO Nietzche!!
Você conhece ele. O ressentimento, a valentia, o culto à Dionisio... Só que ele era ateu, né heehe
"Sou bicho, extasiado numa canção que não é minha."
:)
Já leu Ecce Homo??
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